Tuesday, July 31, 2007

Bergman morreu, Antonioni também, resta quem?

É quase inverosímil que em menos de 24 horas desapareçam Ingmar Bergman e Michelangelo Antonioni. Mas há momentos, como este, em que a verdade é mesmo inverosímil. Hoje parece até pecado tocar neles, mas aqui fica a simbólica homenagem, recordando o primeiro filme do resto de cada uma das minhas vidas.

Michelangelo Antonioni
29 de Setembro de 1912-30 de Julho de 2007


Al di la delle nuvole
1995

free music

Playing: Caetano Veloso, «Michelangelo Antonioni»

Ingmar Bergman
14 de Julho de 1918-30 de Julho de 2007


Scener ur ett äktenskap
1973

free music

Playing: Future Loop Foundation, «Monika's Summer»

TALKING IN BED
Talking in bed ought to be easiest,
Lying together there goes back so far,
An emblem of two people being honest.
Yet more and more time passes silently.
Outside, the wind's incomplete unrest
Builds and disperses clouds in the sky,
And dark towns heap up on the horizon.
None of this cares for us.
Nothing shows why
At this unique distance from isolation
It becomes still more difficult to find
Words at once true and kind,
Or not untrue and not unkind.

Philip Larkin

Descoberta linguística da semana

DRAMA-JUNKIE

Si Belle

REAL.: Gus Guimarães
ANIM.: Adams Carvalho
MÚSICA: «Green Grass», Cibelle

Quando a música e a BD se cruzam assim, dobram-se os olhos e os ouvidos e a sinestesia fica plissada...

Monday, July 30, 2007

Lema para levar na algibeira das férias

MANEIRA DE BEM SONHAR

Adia tudo.
Nunca se deve fazer hoje
o que se pode deixar de fazer também amanhã.
Nem mesmo é necessário que se faça qualquer coisa,
amanhã ou hoje.

Bernardo Soares, Do Sossego

Original Life Soundtrack III

Quem tem a sorte de crescer numa casa onde se ouve Vinicius e Bethânia como quem bebe um copo de ar só pode começar a apreciar as coisas boas da vida desde muito cedo. Primeiro era o Álibi, com «O meu amor» da Ópera do Malandro, «Explode coração» e os seus inesquecíveis versos — «Eu quero mais é me abrir / E que essa vida entre assim / Como se fosse o sol / Desvirginando a madrugada / Quero sentir a dor dessa manhã» —, «Sonho meu» e o triste «Cálice», que demoraria algum tempo a compreender. Mas logo depois veio Nossos Momentos, gravação ao vivo com o Cântico Negro do Régio nos lábios da Bethânia, a abrir com este «O que é, o que é». E nunca mais a vida foi igual:

Viver
E não ter a vergonha de ser feliz
Cantar e cantar e cantar
A beleza de ser um eterno aprendiz
Eu sei
Que a vida devia ser bem melhor
E será
Mas isso não me impede que eu repita:
É bonita, é bonita e é bonita!


Quando se carregar no play, nem sequer se deve ler este post. Pode perturbar o arrepio.



P.S. - Como na música brasileira tudo fica em família, a senhora mais redondinha é a Nana Caymmi, filha do compositor baiano Dorival Caymmi - a quem devemos, entre tantas outras coisas, a inesquecida «Modinha para Gabriela» -, e a senhora mais rectangularzinha é a Miúcha, irmã do Chico Buarque e ex-mulher do João Gilberto, que graças à ordem natural das coisas vem a ser mãe da Bebel Gilberto.

Sunday, July 29, 2007

Ensaios Fotográficos


O FOTÓGRAFO


Difícil fotografar o silêncio.
Entretanto tentei. Eu conto:
Madrugada a minha aldeia estava morta.
Não se ouvia um barulho, ninguém passava entre

as casas.
Eu estava saindo de uma festa.

Eram quase quatro da manhã.
Ia o Silêncio pela rua carregando um bêbado.
Preparei minha máquina.
O silêncio era um carregador?
Estava carregando o bêbado.
Fotografei esse carregador.
Tive outras visões naquela madrugada.
Preparei minha máquina de novo.
Tinha um perfume de jasmim no beiral de um sobrado.
Fotografei o perfume.
Vi uma lesma pregada na existência mais do que na pedra.
Fotografei a existência dela.
Vi ainda um azul-perdão no olho de um mendigo.
Fotografei o perdão.
Olhei uma paisagem velha a desabar sobre uma casa.
Fotografei sobre.

Foi difícil fotografar sobre.
Por fim eu enxerguei a Nuvem de calça.
Representou para mim que ela andava na aldeia de

braços com Maiakovski – seu criador.
Fotografei a Nuvem de calça e o poeta.
Ninguém outro poeta no mundo faria uma roupa

mais justa para cobrir a sua noiva.
A foto saiu legal.


O VENTO

Queria transformar o vento.
Dar ao vento uma forma concreta e apta a foto.
Eu precisava pelo menos de enxergar uma parte física
do vento: uma costela, o olho...
Mas a forma do vento me fugia que nem as formas de uma voz.
Quando se disse que o vento empurrava a canoa do
índio para o barranco
Imaginei um vento pintado de urucum a empurrar a
canoa do índio para o barranco.
Mas essa imagem me pareceu imprecisa ainda.
Estava quase a desistir quando me lembrei do menino
montado no cavalo do vento - que lera em
Shakespeare.
Imaginei as crinas soltas do vento a disparar pelos
prados com o menino.
Fotografei aquele vento de crinas soltas.

Manoel de Barros

Friday, July 27, 2007

Discos Pedidos ou Why Do I Love Covers II

free music


Disco pedido plus Discos Perdidos, na versão dos Nouvelle Vague, Bande à Part. As homenagens ao Godard são sempre bem vindas. Para ir estalando os dedos e batendo o pé debaixo da secretária, enquanto se espera impacientemente que a sexta-feira termine. Também se pode tamborilar e abanar ligeiramente a cabeça, desde que se mantenha alguns dedos no teclado e o monitor dentro do campo de visão.
Bom fim-de-semana :).

Jean-Luc Godard, Bande à Part, 1964

Thursday, July 26, 2007

Música à Prova de Morte ou Why Do I Love Covers I

free music

Em tempo de Tarantino,

Don't Let Me Be Misunderstood by Santa Esmeralda

Lições de Anatomia Estética XV

Meu coração parou.
Bateu-me a garganta.

BS

Neologismo

E eu que digo isto – por que escrevo eu este livro?
Porque o reconheço imperfeito.
Calado seria a perfeição; escrito, imperfeiçoa-se;
por isso o escrevo.

BS

Pássaros sem Vôo Dentro

As tuas mãos são rolas presas. Os teus lábios são rolas mudas (que aos meus olhos vêm arrulhar).
Todos os teus gestos são aves. És andorinha no abaixares-te, condor no olhares-me, águia nos teus êxtases de orgulhosa indiferente. É toda ranger de asas, a lagoa de eu te ver.

BS

Abbas, Mexico-Juchitan 1983

Saudade de Caetano ou Do Romantismo

«Me larga, não enche» é sem dúvida um dos momentos mais românticos de toda a música brasileira. Melhor melhor só o happy ending: «Vagaba! Vampira! Eu vou viver sem você». E viveram felizes para sempre.

Prenda Minha, 1998

A Madeleine de Bernardo Soares

O olfacto é uma vista estranha. Evoca paisagens sentimentais por um desenhar súbito do subconsciente. Tenho sentido isto muitas vezes. Passo numa rua. Não vejo nada, ou antes, olhando tudo, vejo como toda a gente vê. Sei que vou por uma rua e não sei que ela existe com lados feitos de casas diferentes e construídas por gente humana. Passo numa rua. De uma padaria sai um cheiro a pão que nauseia por doce no cheiro dele: e a minha infância ergue-se de determinado bairro distante, e outra padaria me surge daquele reino das fadas que é tudo que se nos morreu. Passo numa rua. Cheira de repente às frutas do tabuleiro inclinado da loja estreita; e a minha breve vida de campo, não sei já quando nem onde, tem árvores ao fim e sossego no meu coração, indiscutivelmente menino. Passo numa rua. Transtorna-me, sem que eu espere, um cheiro aos caixotes do caixoteiro: ó meu Cesário, apareces-me e eu sou enfim feliz porque regressei, pela recordação, à única verdade, que é a literatura.

BS



Ce goût, c'était celui du petit morceau de madeleine que le dimanche matin à Combray (parce que ce jour-là je ne sortais pas avant l'heure de la messe), quand j'allais lui dire bonjour dans sa chambre, ma tante Léonie m'offrait après l'avoir trempé dans son infusion de thé ou de tilleul. La vue de la petite madeleine ne m'avait rien rappelé avant que je n'y eusse goûté ; peut-être parce que, en ayant souvent aperçu depuis, sans en manger, sur les tablettes des pâtissiers, leur image avait quitté ces jours de Combray pour se lier à d'autres plus récents ; peut-être parce que, de ces souvenirs abandonnés si longtemps hors de la mémoire, rien ne survivait, tout s'était désagrégé ; les formes - et celle aussi du petit coquillage de pâtisserie, si grassement sensuel sous son plissage sévère et dévot - s'étaient abolies, ou, ensommeillées, avaient perdu la force d'expansion qui leur eût permis de rejoindre la conscience. Mais, quand d'un passé ancien rien ne subsiste, après la mort des êtres, après la destruction des choses, seules, plus frêles mais plus vivaces, plus immatérielles, plus persistantes, plus fidèles, l'odeur et la saveur restent encore longtemps, comme des âmes, à se rappeler, à attendre, à espérer, sur la ruine de tout le reste, à porter sans fléchir, sur leur gouttelette presque impalpable, l'édifice immense du souvenir.

Marcel Proust, À la Recherche du Temps Perdu - Du Côté de Chez Swan

Music of My Mind Hotter than July

Tenho ganas de gritar dentro da cabeça. Quero parar, esmagar, partir esse impossível disco gramofónico que soa dentro de mim em casa alheia, torturador intangível. […] Endoideço de ter que ouvir. E por fim sou eu, no meu cérebro odientamente sensível, na minha pele pelicular, nos meus nervos postos à superfície, as teclas tecladas em escalas, ó piano horroroso e pessoal da nossa recordação.
E sempre, sempre, como que numa parte do cérebro que se tornasse independente, soam, soam, soam escalas lá em baixo, lá em cima, da primeira casa de Lisboa onde vim habitar.


BS

free music


Stevie Wonder, «As If You Read My Mind»
Hotter than July

Da minha língua vejo o Rio

LIVRO DO DESASSOSSEGO, fr. 259

Gosto de dizer. Direi melhor: gosto de palavrar. As palavras são para mim corpos tocáveis, sereias visíveis, sensualidades incorporadas. Talvez porque a sensualidade real não tem para mim interesse de nenhuma espécie — nem sequer mental ou de sonho —, transmudou-se-me o desejo para aquilo que em mim cria ritmos verbais, ou os escuta de outros. Estremeço se dizem bem. Tal página de Fialho, tal página de Chateaubriand, fazem formigar toda a minha vida em todas as veias, fazem-me raivar tremulamente quieto de um prazer inatingível que estou tendo. Tal página, até, de Vieira, na sua fria perfeição de engenharia sintáctica, me faz tremer como um ramo ao vento, num delírio passivo de coisa movida.

Não tenho sentimento nenhum, político ou social. Tenho, porém, num sentido, um alto sentimento patriótico. Minha pátria é a língua portuguesa.


Bernardo Soares

LÍNGUA
Velô, 1984


Gosto de sentir a minha língua roçar
A língua de Luís de Camões
Gosto de ser e de estar
E quero me dedicar
A criar confusões de prosódias
E uma profusão de paródias
Que encurtem dores
E furtem cores como camaleões
Gosto do Pessoa na pessoa
Da rosa no Rosa
E sei que a poesia está para a prosa
Assim como o amor está para a amizade
E quem há de negar que esta lhe é superior
E deixa os portugais morrerem à míngua
«Minha pátria é minha língua»
Fala mangueira!
Fala!
Flor do Lácio Sambódromo
Lusamérica latim em pó
O que quer
O que pode
Esta língua?
Vamos atentar para a sintaxe dos paulistas
E o falso inglês relax dos surfistas
Sejamos imperialistas
Vamos na velô da dicção choo choo de
Carmen Miranda
E que o Chico Buarque de Holanda nos resgate
E — xeque-mate — explique-nos Luanda
Ouçamos com atenção os deles e os delas da
TV Globo
Sejamos o lobo do lobo do homem
Adoro nomes
Nomes em Ã
De coisas como Rã e Imã
Nomes de nomes
Como Scarlet Moon Chevalier
Glauco Matoso e Arrigo Barnabé e maria da
Fé e Arrigo barnabé
Flor do Lácio Sambódromo
Lusamérica latim em pó
O que quer
O que pode
Esta língua?
Incrível
É melhor fazer um canção
Está provado que só é possível
Filosofar em alemão
Se você tem uma idéia incrível
É melhor fazer um canção
Está provado que só é possível
Filosofar em alemão
Blitz quer dizer corisco
Hollyood quer dizer Azevedo
E o Recôncavo, e o Recôncavo, e o
Recôncavo
Meu medo!
A língua é minha pátria
E eu não tenho pátria: tenho mátria
E quero frátria
Poesia concreta e prosa caótica
Ótica futura
Samba-rap, chic-left com banana
Será que ela está no Pão de Açúcar?
Tá craude brô você e tu lhe amo
Qué queu te faço, nego?
Bote ligeiro
Nós canto-falamos como que inveja negros
Que sofrem horrores no gueto do Harlem
Livros, discos, vídeos à mancheia
E deixe que digam, que pensem e que falem


Caetano Veloso

Skin on Skin


Inquirido sobre a sua raça, respondeu:
— Minha raça sou eu mesmo, João passarinheiro.
Convidado a explicar-se, respondeu:
— Minha raça sou eu mesmo.
A pessoa é uma humanidade individual.
Cada homem é uma raça, senhor polícia.

Mia Couto, Cada Homem é Uma Raça

Monday, July 23, 2007

Original Life Soundtrack II

Banda sonora do Outono de 2006.

This just might hurt a little

love hurts sometimes when you do it right

Don't be affraid of a little bit of pain

pleasure is just on the other side

Listening Once Again

free music

Olhos Dobrados V

Ferdinando Scianna, San Sebastian

Tesourinhos não-deprimentes XVI

Para festejo de todas as mães e de algumas em especial.

Let's Pretend That It's Sunday

Algo se passa no Reino da Suécia: são 29, chamam-se I'm From Barcelona, e o primeiro LP intitula-se Let Me Introduce My Friends. Basta carregar no Play que todo o conceito de segunda-feira se altera. Sugestão: aos primeiros acordes, convocar uma reunião de emergência e pôr o escritório todo a cantar em conjunto. Permitir que se bata palmas. Repetir muitas vezes. Até que o início da semana pareça uma festa. Enjoy it :).


free music


E como eles entendem as nossas segundas...

free music


Oversleeping

Damn! Oversleeping again
Damn! I can't believe I did it once again

I can make it in time
if I jump out of bed
if I skip to wear clothes
and get running instead
if I get on my feet
if I skip to hit snooze
if I don't care to eat
and get running instead
I can make it in time

Been oversleeping on Monday


I don't care let's pretend that it's Sunday

Saturday, July 21, 2007

Blow Up


Blow Up: História de um Fotógrafo, segundo filme a cores de Antonioni, e o primeiro em inglês, foi inspirado numa short story de Julio Cortázar (e lá regressamos à Argentina). Do conto pouco sobrevive à tona do filme, mas a verdade é que a concepção voyeurista e predadora do acto fotográfico que rege a personagem interpretada por David Hemmings está já toda em Las Babas del Diablo:


Entre las muchas maneras de combatir la nada, una de las mejores es sacar fotografías, actividad que debería enseñarse tempranamente a los niños pues exige disciplina, educación estética, buen ojo y dedos seguros.


pero de todas maneras cuando se anda con la cámara hay como el deber de estar atento, de no perder ese brusco y delicioso rebote de un rayo de sol en una vieja piedra, o la carrera trenzas al aire de una chiquilla que vuelve con un pan o una botella de leche. Michel sabía que el fotógrafo opera siempre como una permutación de su manera personal de ver el mundo por otra que la cámara le impone insidiosa (ahora pasa una gran nube casi negra), pero no desconfiaba, sabedor de que le bastaba salir sin la Contax para recuperar el tono distraído, la visión sin encuadre, la luz sin diafragma ni 1/250. Ahora mismo (qué palabra, ahora, qué estúpida mentira) podía quedarme sentado en el pretil sobre el río, mirando pasar las pinazas negras y rojas, sin que se me ocurriera pensar fotográficamente las escenas, nada más que dejándome ir en el dejarse ir de las cosas, corriendo inmóvil con el tiempo. Y ya no soplaba viento.

Creo que sé mirar, si es que algo sé, y que todo mirar rezuma falsedad, porque es lo que nos arroja más afuera de nosotros mismos, sin la menor garantía, en tanto que oler, o (pero Michel se bifurca fácilmente, no hay que dejarlo que declame a gusto). De todas maneras, si de antemano se prevé la probable falsedad, mirar se vuelve posible; basta quizá elegir bien entre el mirar y lo mirado, desnudar a las cosas de tanta ropa ajena. Y. claro, todo esto es más bien difícil.

Pensé que eso lo ponía yo, y que mi foto, si la sacaba, restituiría las cosas a su tonta verdad.
Levanté la cámara, fingí estudiar un enfoque que no los incluía, y me quedé al acecho, seguro de que atraparía por fin el gesto revelador, la expresión que todo lo resume, la vida que el movimiento acompasa pero que una imagen rígida destruye al seccionar el tiempo, si no elegimos la imperceptible fracción esencial.

Metí todo en el visor (con el árbol, el pretil, el sol de las once) y tomé la foto. A tiempo para comprender que los dos se habían dado cuenta y que me estaban mirando, el chico sorprendido y como interrogante, pero ella irritada, resueltamente hostiles su cuerpo y su cara que se sabían robados, ignominiosamente presos en una pequeña imagen química.

recuerdo petrificado, como toda foto, donde nada faltaba, ni siquiera y sobre todo la nada, verdadera fijadora de la escena.

nunca se me había ocurrido pensar que cuando miramos una foto de frente, los ojos repiten exactamente la posición y la visión del objetivo; son esas cosas que se dan por sentadas y que a nadie se le ocurre considerar.

Y yo no podía hacer nada, esta vez no podía hacer absolutamente nada. Mi fuerza había sido una fotografía, ésa, ahí, donde se vengaban de mí mostrándome sin disimulo lo que iba a suceder. La foto había sido tomada, el tiempo había corrido; estábamos tan lejos unos de otros, la corrupción seguramente consumada, las lágrimas vertidas, y el resto conjetura y tristeza. De pronto el orden se invertía, ellos estaban vivos, moviéndose, decidían y eran decididos, iban a su futuro; y yo desde este lado, prisionero de otro tiempo, de una habitación en un quinto piso, de no saber quiénes eran esa mujer, y ese hombre y ese niño, de ser nada más que la lente de mi cámara, algo rígido, incapaz de intervención.


free music

Da OMS: The Yardbirds, Stroll On

Friday, July 20, 2007

Remember Industria Porto - Step 1

Corriam os anos de 90-91. Éramos muitos num Carocha. Tantos que havia pés colados aos vidros. No Inverno começávamos no Bela Cruz Café, no Verão (sim, na altura havia noites de Verão no Porto) na Praia da Luz. Depois, enquanto os mais velhos iam para o Café Buondi, onde agora se comem pizzas industriais, nós fazíamos horas no Twins. E eis que era hora de ir para a Indústria. Já tinha passado o Fisherman's Blues no Twins, devia estar quase a passar o Dunas na Indústria. Mas na altura, depois dos braços no ar ao som dos GNR, e depois do obrigatório Every Breath You Take, o que realmente me deliciava na pista era isto. Rosa Flor.

R.I.P.

É difícil de acreditar mas é verdade:

fecha amanhã, ao fim de 20 anos.

É difícil imaginar o Porto sem ela.

Há que abraçar a pista até ao último minuto.

E ficar à espera de uma noite Remember Industria Porto.

R.I.P.

It's Friday, let's dance

O Phil que me perdoe, mas elas são insuperáveis...

Thursday, July 19, 2007

Tesourinhos não-deprimentes XV

Pensando bem, não deve ter sido nada difícil realizar o videoclip do Pop Goes My Heart... Há pérolas como esta :)

Vislumbre do Verão

Todo abismo é navegável a barquinhos de papel.

Guimarães Rosa

Evolucionismo

Nunca me esqueci aquela frase de Haeckel, o biologista […]. A frase é esta, ou quase esta: que muito mais longe está o homem superior (um Kant ou um Goethe, creio que diz) do homem vulgar que o homem vulgar do macaco. Nunca esqueci a frase porque ela é verdadeira.

BS

Tratado das Férias

«Qualquer estrada», disse Carlyle, «até esta estrada de Entepfuhl, te leva até ao fim do mundo». Mas a estrada de Entepfuhl, se for seguida toda, e até ao fim, volta a Entepfuhl; de modo que o Entepfuhl, onde já estávamos, é aquele mesmo fim do mundo que íamos a buscar.

BS

Edward Hopper, Rooms by the Sea

Original Life Soundtrack I

free music



Ouvido até à exaustão nos anos 95-97. Nunca mais consegui ouvir a voz do Leonard anterior a esta. Dance me to the end of love.

Lições de Anatomia Estética XIV



O meu corpo era um grito latente.
O meu coração batia como se falasse.
Edvard Munch por Bernardo Soares

Wednesday, July 18, 2007

À Porta do DVD

Da Vénus do Botticelli à Afrodite do Sena

DESCUBRA AS DIFERENÇAS

URÂNIA

Purília amancivalva emergidanto,
Imarculado e rósea, alviridente,
Na azúrea juventil conquinomente
Transcurva de aste o fido corpo tanto...

Tenras nadáguas queoculvivam quanto
Palidiscuro, retradito e olente
É minímo desfincta, repente,
Rasga e sedente ao duro latipranto.

Adónica se esvolve na ambolia
De terso antena avante palpinado.
Fímbril, filível, viridorna, gia

Em túlida mancia, vaivinado.
Transcorre uníflo e suspentreme o dia
Noturno ao lia e luçardente ao cado.

Jorge de Sena, Quatro Sonetos a Afrodite Anadiómena

Casa do Livro com Discos Perdidos


Já não sei o que me assombrou mais: se entrar no preciso momento em que tocava o prometido «Feeling Good» da Nina, se a visão inesperada da Vénus do Botticelli ao fundo do corredor, bem mais nítida e com cores muito mais fortes do que o pobre original, que vai definhando atrás de um vidro nos Uffizi. Pensando bem, deve ter sido a absolutamente anacrónica mistura da Nina com o Botticelli a razão do assombro. Parabéns à Casa do Livro pelo lugar de excepção, e ao Vinyl pela música de excepção.
Não, os Lambchop não tocaram. Trata-se de um efeito dominó. Tocou o Josh Rouse. Eu pensei que era a voz do Morrissey. Restituída a verdade das vozes, lembrei-me que em tempos o Josh Rouse me tinha despertado um interesse muito fugaz. Depois foi fácil chegar à razão da fugacidade: o Josh Rouse gravou um álbum com o Kurt Wagner, vocalista dos Lambchop. Por essa altura, o Kurt Wagner concentrava tudo aquilo que eu achava que devia ser uma voz. Foi no tempo do Is a Woman, com direito ao Is a Bonus, que não parava de tocar e tocar e tocar. Nunca mais pensei no Josh. Até ontem. E fiquei foi com saudades do Kurt.

Tuesday, July 17, 2007

Língua do Desassossego

Suponhamos que vejo diante de nós uma rapariga de modos masculinos. Um ente humano vulgar dirá dela, «Aquela rapariga parece um rapaz». Um outro ente humano vulgar, já mais próximo da consciência de que falar é dizer, dirá dela, «Aquela rapariga é um rapaz». Outro ainda, igualmente consciente dos deveres da expressão, mas mais animado do afecto pela concisão, que é a luxúria do pensamento, dirá dela, «Aquele rapaz». Eu direi, «Aquela rapaz», violando a mais elementar das regras da gramática, que manda que haja concordância de género, como de número, entre a voz substantiva e a adjectiva. E terei dito bem; terei falado em absoluto, fotograficamente, fora da chateza, da norma, da quotidianidade. Não terei falado: terei dito.

BS

Lições de Anatomia Estética XIII

À roda dos olhos e como dedos nos ouvidos há um aperto de dentro da cabeça.
Parece uma constipação na alma.

Senti a vida no estômago, e o olfacto tornou-se-me uma coisa por detrás dos olhos.

As vozes saem do ar, e não de gargantas.

Ainda do Desassossego

A ironia da lucidez

O mal romântico é este:
é querer a lua como se houvesse maneira de a obter.

Bernardo Soares


BANDA SONORA
free music

Feist, My Moon My Man, The Reminder

Da Genealogia

Isto:

free music

Serge + Jane


só podia ter dado à luz isto:

free music

Charlotte

O tempero é dos Air.

Teoria do Banho

Assim como lavamos o corpo deveríamos lavar o destino, mudar de vida como mudamos de roupa — não para salvar a vida, como comemos e dormimos, mas por aquele respeito alheio por nós mesmos, a que propriamento chamamos asseio.

Bernardo Soares

Olhos Dobrados IV


Mas em que pensava eu antes de me perder a ver?
BS, still


Ferdinando Scianna, Turim, 1987

Monday, July 16, 2007

Open your ears and see

free music


Yo-Yo Ma interpreta a melhor música de Morricone, Gabriel's Oboe. Alguns dos melhores momentos do cinema só podem mesmo ser vistos with our eyes wide shut. O Kubrick é que sabia.