Saturday, January 30, 2010

Últimos Poemas, de Nuno Morais

Com data marcada para o próximo dia 8 de Fevereiro, no Centro Cultural de Belém, a Sociedade Portuguesa de Autores e a RTP juntam-se para atribuir uma nova categoria de prémios que reconhecem o que de melhor se fez no cinema, teatro, artes visuais, música, literatura, televisão, rádio e publicidade em 2009.

Vão chamar-se assim mesmo, Prémios Autores SPA/RTP. José Jorge Letria, vice-presidente da SPA afirma que a ideia de criar um prémio para a obra autoral, nas suas várias áreas, partiu da SPA e que foi apresentada à RTP, onde foi muito bem acolhida, desde os primeiros contactos: “Foi uma relação exemplar”, afirmou ontem durante a apresentação dos prémios, sobre o diálogo com o vice-presidente da televisão pública José Marquitos.

João Lourenço, encenador e administrador adjunto da SPA defende que este galardão vem dar alguma notoriedade a uma área em risco: “Quando a propriedade intelectual é posta em perigo e o governos e as pessoas, por desconhecimento, não se importam, têm de ser as sociedades de autores a tomar este tipo de iniciativa. João Lourenço, que participará na coordenação do espectáculo de dia 8, afirma que não será uma gala “hollywoodesca”: 2Só porque não há meios económicos, criadores há”. Mas que terá a dignidade que os autores merecem.

Os prémios, com um troféu assinado pelo designer Henrique Cayate são, nas palavras do director de programas da RTP, “José Fragoso”uma iniciativa que fazia falta aos autores, à televisão e ao público”.

Cada categoria terá três elementos de júri, entre personalidades da área em causa, e serão nomeados três trabalhos em cada uma dessas categorias. Um deles ganhará.

Mas José Jorge Letria avançou duas categorias “especiais” que já foi definido a quem serão atribuídos. Para o prémio Melhor Programação Cultural Autárquica foi escolhida a Câmara Municipal de Cascais, em parte pela inauguração do Museu Paula Rego e pela organização do Festival de Cinema do Estoril, referiu o responsável da SPA. E no prémio vida e obra foi escolhido o nome de Júlio Pomar que, nas palavras de José Jorge Letria “é um dos maiores pintores de sempre e um criador plástico com grande projecção internacional”.

Literatura
Júri
Pedro Mexia
Rita Pimenta
Annabela Rita
Melhor livro de poesia
A luz fraterna (António Osório)
Ofício Cantante (Poesia completa de Herberto Hélder)
Últimos poemas (Nuno Rocha Morais – título póstumo)



Um porto – a putrescência da chegada,
Mescla de cânhamo, gasóleo, maresia.
Trepidação, gritaria, a água imunda,
Mas irisada com os rastos de óleo,
Um espelho talvez mais rigoroso.
Pestanejamos para habituar os olhos
Ao fim da viagem, às cores mais sombrias.
Resta saber se teremos de facto viajado,
Se nos tisnámos sob sóis bastantes
Para nos fazer mudar de pele,
Se fugimos às cordas de latitudes,
Se há longitudes que nos alcançaram,
Se o remisso regresso é só mais um revés,
Só mais um grau na translação da angústia.
O que saberemos quando se der o leve baque
Com que a terra nos recebe?

Tuesday, January 19, 2010

Sadedoria


Tout est bon quand il est excessif.

La Nouvelle Justine

Tuesday, January 12, 2010

Monday, January 11, 2010

saudade imensa de estar aqui, ficar aqui a ler vasco gato o dia inteiro

estar aqui, ficar aqui

a minha alegria é o aroma de tangerina nos dedos,
comer aos gomos a paisagem
e limpar depois
a boca
à manga do espanto.
Tu puxas-me
e somos duas crianças
num trilho de mata
num banco de pedra,
num portão verde dividindo
o aqui e o ali.
Porque nós estamos aqui.
Aqui onde te entrego os meus bolsos,
e - repara - as tuas mãos cabem.

Nós estamos aqui.

Menina do rio na tua canoa de silêncios, a tua voz enrola-se na minha voz como prédios
e sombra numa cidade, como leite e açúcar na infância, como
o destino de um navio.
Atravesso quilometricamente a pobreza deste reino para te ver, para te ver uma bússola de neve,
uma corda vermelha, a destreza de um telhado através dos
dias.
Tu não precisas falar uma outra língua, o persa é uma língua que nos chega! Tu não precisas oferecer-me
portas e milhares de portas, basta que apareças.
Que apareças nesta fogueira de bruxas, na inquisição canina de uma época longe, muito longe,
dolorosamente longe da magia de um homem e de uma mulher.

Nós estamos aqui para arder pelo nosso corpo completo.
Tu e eu, leões estirados ao sol,
harpa para os nossos dedos quentes,
poema numa sala de lâminas.

Nós estamos aqui para fugir, nós estamos aqui para chegar
de vez.

Vasco Gato
47

Janeiro

É esta a completude dos dias
Quando se reúnem sobre a cidade
Os sossegos da nossa idade já meiga.
São estas as palavras que ficam
Desde o interior do nosso mais antigo nome.

É o inverno aberto de janeiro
Com as árvores despidas e o frio azul,
É o ano que começa no tempo que é nada,
Os bolsos que se enchem de mãos,
As casas que parecem mais juntas.

Por esta altura estarão a nascer
As horas mais felizes das nossas vidas
- bebemos chá escutando o lume
E amanhã será um dia a menos,
Um outro som acrescentando à voz,
Um abraço fechando-se até ao amor.

Vasco Gato

looping...

Wednesday, January 6, 2010

Então Joana abriu a porta do jardim e saiu

Quando se viu sozinha no meio da rua teve vontade de voltar para trás. As árvores pareciam enormes e os seus ramos sem folhas enchiam o céu de desenhos iguais a pássaros fantásticos. E a rua parecia viva. Estava tudo deserto. Àquela hora não passava ninguém. Estava toda a gente na Missa do Galo. As casas, dentro dos seus jardins, tinham as portas e as janelas fechadas. Não se viam pessoas, só se viam coisas. Mas Joana tinha a impressão de que as coisas a olhavam e a ouviam como pessoas.
«Tenho medo», pensou ela.
Mas resolveu caminhar para a frente sem olhar para nada.
Quando chegou ao fim da rua virou à direita e meteu a um atalho entre dois muros. E no fim do atalho encontrou os campos, planos e desertos. Ali, sem muros nem árvores nem casas, a noite via-se melhor. Uma noite altíssima e redonda e toda brilhante.
O silêncio era tão forte que parecia cantar. Muito ao longe via- se a massa escura dos pinhais.
«Será possível que eu chegue até lá?», pensou Joana.
Mas continuou a caminhar.
Os seus pés enterravam-se nas ervas geladas. Ali no descampado soprava um curto vento de neve que lhe cortava a cara como uma faca.
«Tenho frio», pensou Joana.
Mas continuou a caminhar.
À medida que se ia aproximando dele, o pinhal ia-se tornando maior. Até que ficou enorme.
Joana parou um instante no meio dos campos.
«Para que lado ficará a cabana?», pensou ela.
E olhava em todas as direcções à procura de um rasto.
Mas à sua direita não havia rasto, à sua esquerda não havia rasto e à sua frente não havia rasto.
«Como é que hei-de encontrar o caminho?», perguntava ela.
E levantou a cabeça.
Então viu que no céu, lentamente, uma estrela caminhava.
«Esta estrela parece um amigo», pensou ela.
E começou a seguir a estrela.
Até que penetrou no pinhal. Então num instante as sombras fizeram uma roda à sua volta. Eram enormes, verdes, roxas, pretas e azuis, e dançavam com grandes gestos. E a brisa passava entre as agulhas dos pinheiros, que pareciam murmurar frases incompreensíveis. E vendo-se assim rodeada de vozes e de sombras Joana teve medo e quis fugir. Mas viu que no céu, muito alto, para além de todas as sombras, a estrela continuava a caminhar. E seguiu a estrela.
Já no meio do pinhal pareceu-lhe ouvir passos.
«Será um lobo?», pensou.
Parou a escutar. O barulho dos passos aproximava-se. Até que viu surgir entre os pinheiros um vulto muito alto que vinha caminhando ao seu encontro.
«Será um ladrão?», pensou.
Mas o vulto parou na sua frente e ela viu que era um rei. Tinha na cabeça uma coroa de oiro e dos seus ombros caía um longo manto azul todo bordado de diamantes.
— Boa noite — disse Joana.
— Boa noite — disse o rei. — Como te chamas?
— Eu, Joana — disse ela.
— Eu chamo-me Melchior — disse o rei. E perguntou:
— Onde vais sozinha a esta hora da noite?
— Vou com a estrela — disse ela.
— Também eu — disse o rei —, também eu vou com a estrela.
E juntos seguiram através do pinhal.
E de novo Joana ouviu passos. E um vulto surgiu entre as sombras da noite.
Tinha na cabeça uma coroa de brilhantes e dos seus ombros caía um grande manto vermelho coberto de muitas esmeraldas e safiras.
— Boa noite — disse ela. — Chamo-me Joana e vou com a estrela.
— Também eu — disse o rei —, também eu vou com a estrela e o meu nome é Gaspar.
E seguiram juntos através dos pinhais. E mais uma vez Joana ouviu um barulho de passos e um terceiro vulto surgiu entre as sombras azuis e os pinheiros escuros.
Tinha na cabeça um turbante branco e dos seus ombros caía um longo manto verde bordado de pérolas. A sua cara era preta.
— Boa noite — disse ela. — O meu nome é Joana. E vamos com a estrela.
— Também eu — disse o rei — caminho com a estrela e o meu nome é Baltasar.
E juntos seguiram os quatro através da noite.
No chão, os galhos secos estalavam sob os passos, a brisa murmurava entre as árvores e os grandes mantos bordados dos três reis do Oriente brilhavam entre as sombras verdes, roxas e azuis.
Já quase no fundo dos pinhais viram ao longe uma claridade. E sobre essa claridade a estrela parou.
E continuaram a caminhar.
Até que chegaram ao lugar onde a estrela tinha parado e Joana viu um casebre sem porta. Mas não viu escuridão, nem sombra, nem tristeza. Pois o casebre estava cheio de claridade, porque o brilho dos anjos o iluminava.
E Joana viu o seu amigo Manuel. Estava deitado nas palhas entre a vaca e o burro e dormia sorrindo.
Em sua roda, ajoelhados no ar, estavam os anjos. O seu corpo não tinha nenhum peso e era feito de luz sem nenhuma sombra.
E com as mãos postas os anjos rezavam ajoelhados no ar.
Era assim, à luz dos anjos, o Natal de Manuel.
— Ah — disse Joana — aqui é como no presépio!
— Sim — disse o rei Baltasar — aqui é como no presépio.
Então Joana ajoelhou-se e poisou no chão os seus presentes.

Sophia de Mello Breyner Andresen
A Noite de Natal
1989

Sunday, January 3, 2010

2010: Impossible to decide between one happiness and the other...


Jonathan Jeremiah | Happiness
Quiet Village Remix | Universal | 2009




Jonathan Jeremiah | Happiness
Morgan Geist's Port Authority Remix | Universal | 2009