Wednesday, December 26, 2007

Final Countdown VII or Brazilian Note for Cinderella: 2007 Last Post


Um beijo

que tivesse um blue.
Isto é
imitasse feliz
a delicadeza, a sua,
assim como um tropeço
que mergulha surdamente
no reino expresso
do prazer
Espio sem um ai
as evoluções do teu confronto
à minha sombra
desde a escolha
debruçada no menu;
um peixe grelhado
um namorado
uma água
sem gás
de decolagem:
leitor ensurdecido
talvez embevecido
“ao sucesso”
diria meu censor
“à escuta”
diria meu amor
sempre em blue
mas era um blue
feliz
indagando só
“what’s new”
uma questão
matriz
desenhada a giz
entre um beijo
e a renúncia intuída
de outro beijo.
Ana Cristina César

Edvard Munch, Kiss on the Beach, 1921


BOCA DE LUAR


- Você tem boca de luar, disse o rapaz para a namorada, e a namorada riu, perguntou ao rapaz que espécie de boca é essa, o rapaz respondeu que é uma boca toda enluarada, de dentes muito alvos e leitosos, entende? Ela não entendeu bem e tornou a perguntar, desta vez que lua correspondia à sua boca, se era crescente, minguante, cheia ou nova. Ao que o rapaz disse que minguante não podia ser, nem crescente, nem nova, só podia ser lua cheia, uai. Aí a moça disse que mineiro tem cada uma, onde é que se viu boca de lua cheia, até parece boca cheia de lua, uma bobice. O rapaz não gostou de ser chamada de bobice a sua invenção, exclamou meio espinhado que boca de luar, mesmo sendo de luar de lua cheia, é completamente diferente - insistiu: com-ple-ta-men-te - de boca cheia de lua; é uma imagem poética e daí isso não tem nada que ver com mineiro, ele até nem era propriamente mineiro, nasceu em Minas por acaso, seu pai era juiz de direito numa comarca de lá, mas viera do Rio Grande do Norte, depois o pai deixou a magistratura e se mudou para São Paulo, onde ele passou a infância, mudando-se finalmente para o Rio com a família. Ah, disse a moça, você ficou zangado comigo, diga, ficouzinho? bobo, te chamo de bobo como te chamo meu bem, fica nervosinho não, eu agora estou sentindo que o que você falou é uma graça, boca de luar é legal, olha aqui, vou te dar um beijo superluar, você quer? Ele ensaiou uma cara de quem não faz questão de ser beijado, mas os lábios da moça estavam já assumindo a forma de beijo, avançavam para ele num movimento que parecia comandar e concentrar todo o corpo, como resistir? Pois resistiu, se bem que com intenção de ceder: daí a pouco. Não ficava bem desmanchar a zanga assim tão depressa, ela ia ter a impressão de que ele nem sabia ficar com raiva, a simples oferta de beijo o amolecia, e que seria do casamento deles, se houvesse casamento? Não é que pensasse em casar com a moça, longe disso, não pensava em casar com ela nem com moça nenhuma nos próximos 10 anos, mas é bom manter a linha de durão mesmo sem perspectiva de futura manutenção de autoridade. É da lei não escrita, homem ficar emburrado e não fazer por menos. Então é assim? falou baixinho a moça, você não quer o meu beijo oferecido de coração, pois não vai ter mais nenhum nem agora nem depois de amanhã nem nunca, ouviu, seu bolha? E os lábios recuaram tanto que foi como se despregassem do rosto ali diante do moço zangado e fugissem para longe, para onde nem sequer fossem vistos, e escusa de procurar, porque boca de boca desprezada some na nuvem mais escura, por trás daquela serra para os lados de Teresópolis. E eu vou sofrer com isso? o moço não disse mas falou consigo mesmo, que bem me importa se ela não quer mais me beijar, eu beijo outras, beijo a prima dela, beijo milhões e acabou-se. Mas a moça, que despachara os lábios para o sem-fim, continuava diante dele, muito saborosa e séria, séria e saborosa, aquela pele fina e dourada, aqueles olhões, aquele busto, aquilo tudo de primeiríssima beleza, sem falar na boca ausente mas presente, sabe como é? Ele não sabia, mas a vontade de provar o beijo reapareceu depois que o beijo fora recusado para todo o sempre, e o rapaz avançou o braço direito para pegar docemente no queixo da moça, quem disse que o queixo cedeu? Ele fez um gesto mais positivo, tentando segurar o ombro da moça, o ombro esquivou-se ao toque, embora ela não recuasse. Continuavam próximos um do outro, a uma distância infinita do entendimento. Forçar o beijo seria besteira, ela cerraria os lábios, a boca de luar não se abriria na aceitação úmida da sua. E que gosto pode ter beijo roubado, se até o que não é roubado costuma ser insípido quando as duas partes não se movem pelo mesmo impulso de doação e devoração? A moça visivelmente esperava o ataque, ele visivelmente se proibia de atacar, isso durou um tempão, com o beijo parado em potencial entre os poucos centímetros de uma boca a outra, eis senão quando - ui! - uma formiga, não mais que uma formiguinha, vinda de não se sabe que subterrâneo preparado para expedi-la, em momentos que tais, começou a subir ziquezagueando pelo pescoço da moça, ela deu um grito, ele precipitou para caçar a formiguinha, os rostos tocaram-se, os lábios também, e o beijo desabrochou, flor na ponta de duas hastes conjugadas, superlunar e inevitável, beijo fluido e forte, resultante da incompreendida imagem poética ou da formiguinha encomendada, quem sabe, pelo rapaz? ou pela moça?

Carlos Drummond de Andrade
Itabira, 1902-Rio de Janeiro, 1987

Friday, December 21, 2007

Final Countdown VI: É Sexta, tira o pé do chão


Elis
Falso Brilhante
1976


E precisamos todos rejuvenescer

Thursday, December 20, 2007

Final Countdown V

Martin Parr, Ipanema 2007


Clara Moreno - Meu Samba Torto
Found at skreemr.com

FAGULHA

Abri curiosa
o céu.
Assim, afastando de leve as cortinas.
Eu queria rir, chorar,
ou pelo menos sorrir
com a mesma leveza com que
os ares me beijavam.

Eu queria entrar,
coração ante coração,
inteiriça,
ou pelo menos mover-me um pouco,
com aquela parcimônia que caracterizava
as agitações me chamando.

Eu queria até mesmo
saber ver,
e num movimento redondo
como as ondas
que me circundavam, invisíveis,
abraçar com as retinas
cada pedacinho de matéria viva.

Eu queria
(só)
perceber o invislumbrável
no levíssimo que sobrevoava.

Eu queria
apanhar uma braçada
do infinito em luz que a mim se misturava.

Eu queria
captar o impercebido
nos momentos mínimos do espaço
nu e cheio.

Eu queria
ao menos manter descerradas as cortinas
na impossibilidade de tangê-las

Eu não sabia
que virar pelo avesso
era uma experiência mortal

Ana Cristina César
Rio de Janeiro, 1952-1983

Wednesday, December 19, 2007

Final Countdown IV: Blue Brasil

Rene Burri, Hummingbird
Brasilia 1960


Os pássaros sentem-se bem no ar, os peixes sentem-se bem na água: os homens não se sentem bem na terra.

Murilo Mendes

Final Countdown III

A PESCARIA

Foi nas margens do Ipiranga,
Em meio a uma pescaria.
Sentindo-se mal, D. Pedro
— Comera demais cuscuz —
Desaperta a barriguilha
E grita, roxo de raiva:
“Ou me livro d’esta cólica
Ou morro logo d’ua vez!”
O príncipe se aliviou,
Sai no caminho cantando:
“Já me sinto independente.
Safa! vi perto a morte!
Vamos cair no fadinho
Pra celebrar o sucesso.”
A Tuna de Coimbra surge
Com as guitarras afiadas,
Mas as mulatas dengosas
Do Club Flor do Abacate
Entram, firmes, no maxixe,
Abafam o fado com a voz,
Levantam, sorrindo, as pernas...
E a colônia brasileira
Toma a direção da farra.

Murilo Mendes

Memo

Tive por prisão o infinito.

Final Countdown II

HOMO BRASILIENSIS

O homem
É o único animal que joga no bicho.

Murilo Mendes
Juiz de Fora 1901-Lisboa 1975

A SENTIMENTAL JOURNEY

I’d like to get away from earth awhile
And then come back to it and begin over.
May no fate willfully misunderstand me
And half grant what I wish and snatch me away
Not to return. Earth’s the right place for love:
I don’t know where it’s likely to go better.

Robert Frost

Acaricio a cidade,
a sua pele húmida.
Que destino persegue ainda
O destino destas mãos?

Tuesday, December 18, 2007

Friday, December 14, 2007

Wednesday, December 12, 2007

Ensaio sobre a Beleza


De Profanatione Cordis

Julião Sarmento, I Can't Forget You
2006
Técnica mista sobre tela, 91.5 x 91.5 cm

Ding-a-Ling Preview 1


Mot-valise da semana

CAOSMOS

every person, place and thing in the chaosmos of Alle anyway connected with the gobblydumped turkery was moving and changing every part of the time
James Joyce, Finnegans Wake, 1939

À penser

But let it be considered that hardly any thing can strike the mind with its greatness, which does not make some sort of approach towards infinity; which nothing can do whilst we are able to perceive its bounds; but to see an object distinctly, and to perceive its bounds, is one and the same thing.
A clear idea is therefore another name for a little idea.

Edmund Burke, 1756

Sunday, December 9, 2007

Le Fabuleux Destin de T


Tindersticks, só porque passam 30 anos sobre 9 de Dezembro de 1977.
Tindersticks, só porque há lyrics assim:

I could take all the craziness out of you
The ones that matter fight against themselves
So you could take all this craziness out of me

Friday, December 7, 2007

31 FORA DE PORTAS

Este fim-de-semana, o 31 apoia o evento STOCKMARKET, na Exponor.

Sexta, 7 de Dezembro, das 17h00 às 22h00, Preview para convidados.
Sábado e Domingo, 8 e 9 de Dezembro, das 10h00 às 20h00.

Para além do bar, o 31 será responsável pela música, com os DJs Social Disco Club (Are You Re-Edit?), 5uper'Cinco (Dirty Disco), Pedro Tenreiro (Dancin'Days), Joana Matos Frias (After Eighties) e Rui Trintaeum (31StereoSound).

Tesourinhos não-deprimentes XX: A Gula no Advento

Day After Control, Irretrievably




We are the hollow men
We are the stuffed men
Leaning together
Headpiece filled with straw. Alas!
Our dried voices, when
We whisper together
Are quiet and meaningless
As wind in dry grass
Or rats' feet over broken glass
In our dry cellar
Shape without form shade without colour,
Paralyzed force, gesture without motion;

Those who have crossed

With direct eyes to death's other Kingdom

Remember us - if at all - not as lost

Violent souls, but only

As the hollow men

The stuffed men.


This is the dead land
this is cactus land
Here the stone images
Are raised, here they receive
The supplication of a dead man's hand
Under the twinkle of a fading star.

Is it like this
In death's other kingdom

Waking alone

At the hour when we are

Trembling with tenderness

Lips that would kiss

Form prayers to broken stone



Between the conception
And the creation
Between the emotion
And the response
Falls the Shadow
Life is very long

Between the desire
And the spasm
Between the potency
And the existence
Between the essence
And the descent
Falls the Shadow
For Thine is the Kingdom

For Thine is
Life is
For thine is the

This is the way the way the world ends
This is the way the way the world ends
This is the way the way the world ends
Not with a bang but a whimper.

T.S. Eliot, pieces of Hollow Men

De Parabéns

Universidade do Porto mais uma vez entre as melhores universidades do mundo

Está entre as melhores do mundo e é a única presença portuguesa no "2007 Performance Ranking of Scientific Papers for World Universities". De acordo com este ranking, promovido pelo "Higher Education Evaluation & Accreditation Council of Taiwan", a Universidade do Porto ocupa o 459º lugar entre as 500 melhores universidades do mundo.
Recorrendo a dados quantitativos do Science Citation Index (SCI) e do Social Sciences Citation Index (SSCI), o projecto avaliou e classificou a performance da produção científica das universidades de acordo com três critérios:
20% é o peso atribuído à produtividade científica (os indicadores prendem-se com o número de artigos produzidos entre 1996 e 2006 - 10% -, e os outros 10% com o nº de artigos de 2006);
O impacto da investigação merece 30% (entram aqui como indicadores o número de citações entre 1996 e 2006, a média deste número e os artigos citados entre 2005 e 2006);
À excelência da investigação são atribuídos 50%. Os indicadores são: o Índice H entre 2005 e 2006 (Índice de Hirsche = h significa que existem h artigos com, no mínimo, h citações); o número de artigos muito citados entre 1997 e 2007; os artigos citados durante o ano de 2006 em revistas de elevado impacto e o número de domínios científicos em que a universidade demonstrou excelência entre 1996 e 2006.
A Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, é a primeira classificada a nível mundial, sendo que, no continente europeu, o primeiro e segundo lugares vão para Inglaterra (Universidade de Cambridge e de Oxford, respectivamente). A nível europeu, a U.Porto ocupa a 195ª posição.
António Marques acrescenta que "com a divulgação deste ranking, a U.Porto vê reforçada a tendência que a confirma como parte do universo muito restrito (3%) das melhores universidades e Instituições de Ensino Superior (IES), entre as cerca de 17.000 em todo o mundo". O vice-reitor especifica que "com a excepção do Times Higher Education Supplement (THES), a U.Porto está entre as melhores universidades e IES e em todos os grandes rankings internacionais de referência como o Academic Ranking of World Universities elaborado pela Shanghai Jiao Tong University, o Ranking Ibero-americano de Instituições de Investigação, o Webometrics Ranking of World Universities e o 4ICU, nos quais se tem afirmado como a 1ª universidade portuguesa".
AS/REIT

Thursday, December 6, 2007

Wednesday, December 5, 2007

Voluptas, com Nietzsche

É preciso ter asas, quando se ama o abismo.

F. Nietzsche, Ditirambos de Dionysos IV

Caspar David Friedrich 1818

Voluptas, against Pessoa

Ai que prazer
Ter um livro para ler
E não deixar de o fazer.
O sol doira mais
Com literatura.
imagino que sobre nós virá um céu
de espuma e que, de sol em sol,
uma nova língua nos fará dizer
o que a poeira da nossa boca adiada
soterrou já para lá da mão possível
onde cinzentos abandonamos a flor.

dizes: põe nos meus os teus dedos
e passemos os séculos sem rosto,
apaguemos de nossas casas o barulho
do tempo que ardeu sem luz.
sim, cria comigo esse silêncio
que nos faz nus e em nós ascende
o lume das árvores de fruto.

diz-me que há ainda versos por escrever,
que sobra no mundo um dizer ainda puro.

Vasco Gato, um mover de mão, 2000

Tuesday, December 4, 2007

Rufus Over the Rainbow

Finally, em CD

Mais do que despido, nu

Por mais que dispamos o que vestimos, nunca chegamos à nudez, pois a nudez é um fenómeno da alma e não de tirar fato.

Bernardo Soares

Lições de Anatomia Estética XXIV

Pesam-me as pálpebras nos pés arrastados. Quisera dormir porque ando. Tenho a boca fechada como se fosse para os beiços se pegarem.Uma ou outra pessoa olha-me como se me conhecesse e me estranhasse. Sinto que os olho também com órbitas sentidas sob pálpebras que as roçam, e não quero saber de haver mundo.
Bernardo Soares

O que há de mais reles nos sonhos
é que todos os têm.
Bernardo Soares

Absolut Magritte




Monday, December 3, 2007

Gino e Giovanna: Fotograma da Semana

Ossessione, dir. Luchino Visconti, 1943

Between grief and nothing,
I will take grief.
Faulkner dixit, Godard repetiu

Happy Songs for Happy People longing for Happy Mondays


LUCKY SOUL
Influences: [...] nothing with the words 'chill out' in it... :)

Add your light to mine, baby
Together we could shine

Whispering Songs for Whispering People longing for Whispering Mondays


TUNNG

Leave me lying where I fell
Rivers running out of me

Saturday, December 1, 2007

Feels Like Feist ou Why Do I Love Covers V


Feist, Inside and Out, après Bee Gees

Her Other Choice

WIDES
27 Jun. 1948-21 Jul. 2004

Bizou Bizou

En Rouge et Bleu

Et bla, bla, bla

Mon Coeur Te Dit Je T'Aime

Fresh Funk-Soul Addiction


Sharon Jones and The Dip Dap Kings, 100 Days, 100 Nights




This Land is Our Land

Digital People by Pedro Bruschy

A Fotografia tem qualquer coisa de tautológico: nela, um ca­chimbo é sempre um cachimbo, infalivelmente.

Roland Barthes, La Chambre Claire


The Son of Man

O azul do céu estava sujo de branco transparente.
Bernardo Soares

Crazy Damn World



Decor Shop


Fragil

Hit and Run


Long Play

Friday, November 30, 2007

SMS = Sexta Menos Saltitante


Rilo Kiley, «I Never», More Adventurous

Happy Birthday, Jonathan

Não fosse a celebração destes 340 anos, e a humanidade não teria conhecido uma das obras mais fascinantes da ficção de todos os tempos. Eis Gulliver, na terra mais insólita que visita (não, não é Lilliput):

We next went to the School of Languages, where three Professors sate in Consultation upon improving that of their own country. The first Project was to shorten Discourse by cutting Polysyllables into one, and leaving out Verbs and Participles, because in reality all things imaginable are but Nouns.
The other, was a Scheme for entirely abolishing all Words whatsoever; and this was urged as a great Advantage in Point of Health as well as Brevity. For it is plain, that every Word we speak is in some Degree a Diminution of our Lungs by Corrosion, and consequently contributes to the shortning of our Lives. An Expedient was therefore offered, that since Words are only Names for Things, it would be more convenient for all Men to carry about them, such Things as were necessary to express the particular Business they are to discourse on. And this Invention would certainly have taken Place, to the great Ease as well as Health of the Subject, if the Women in conjunction with the Vulgar and Illiterate had not threatned to raise a Rebellion, unless they might be allowed the Liberty to speak with their Tongues, after the manner of their Ancestors; such constant irreconcilable Enemies to Science are the common People. However, many of the most Learned and Wise adhere to the New Scheme of expressing themselves by Things, which hath only this Inconvenience attending it, that if a Man's Business be very great, and of various kinds, he must be obliged in Proportion to carry a greater bundle of Things upon his Back, unless he can afford one or two strong Servants to attend him. I have often beheld two of those Sages almost sinking under the Weight of their Packs, like Pedlars among us; who, when they met in the Streets, would lay down their Loads, open their Sacks, and hold Conversation for an Hour together; then put up their Implements, help each other to resume their Burthens, and take their Leave.
But for short Conversations a Man may carry Implements in his Pockets and under his Arms, enough to supply him, and in his House he cannot be at a loss: Therefore the Room where Company meet who practise this Art, is full of all Things ready at Hand, requisite to furnish Matter for this kind of artificial Converse.Another great Advantage proposed by this Invention, was that it would serve as a Universal Language to be understood in all civilized Nations, whose Goods and Utensils are generally of the same kind, or nearly resembling, so that their Uses might easily be comprehended. And thus Embassadors would be qualified to treat with foreign Princes or Ministers of State to whose Tongues they were utter Strangers.

Jonathan Swift, Gulliver's Travels, Part III: A Voyage To Laputa, Balnibarbi, Luggnagg, Glubbdubdrib and Japan

E como o dia é de aniversários e o da morte de Pessoa é para esquecer e não para lembrar, celebre-se os 70 de Ridley Scott, sem gangster americano e com o Vangelis nas veias, na que será sempre a sua obra-prima. Blessed Blade Runner.

Wednesday, November 28, 2007

Tresler Camões

TRÍPTICO / I

«Transforma-se o amador na coisa amada» com seu
feroz sorriso, os dentes,
as mãos que relampejam no escuro. Traz ruído
e silêncio. Traz o barulho das ondas frias
e das ardentes pedras que tem dentro de si.
E cobre esse ruído rudimentar com o assombrado
silêncio da sua última vida.
O amador transforma-se de instante para instante,
e sente-se o espírito imortal do amor
criando a carne em extremas atmosferas, acima
de todas as coisas mortas.

Transforma-se o amador. Corre pelas formas dentro.
E a coisa amada é uma baía estanque.
É o espaço de um castiçal,
a coluna vertebral e o espírito
das mulheres sentadas.
Transforma-se em noite extintora.
Porque o amador é tudo, e a coisa amada
é uma cortina
onde o vento do amador bate no alto da janela
aberta. O amador entra
por todas as janelas abertas. Ele bate, bate, bate.
O amador é um martelo que esmaga.
Que transforma a coisa amada.

Ele entra pelos ouvidos, e depois a mulher
Que escuta
fica com aquele grito para sempre na cabeça
a arder como o primeiro dia do verão. Ela ouve
e vai-se transformando, enquanto dorme, naquele grito
do amador.
Depois acorda, e vai, e dá-se ao amador,
dá-lhe o grito dele.
E o amador e a coisa amada são um único grito
anterior de amor.

E gritam e batem. Ele bate-lhe com o seu espírito
de amador. E ela é batida, e bate-lhe
com o seu espírito de amada.
Então o mundo transforma-se neste ruído áspero
do amor. Enquanto em cima
o silêncio do amador e da amada alimentam
o imprevisto silêncio do mundo
e do amor.

Herberto Helder

Tuesday, November 27, 2007

Tuesday's Friday Mood

Olhos Dobrados IX

Augusto de Campos, «Olho por Olho», 1964

A fantasia de se sentir embalado pelo mundo

Desça, sem pressa, degrau por degrau, sendo tolerante com o espanto (coitados!) dos pobres familiares, que cobrem a boca com a mão enquanto se comprimem ao pé da escada. Passe por eles calado, circule pela casa toda como se andasse numa praia deserta (mas sempre com a mesma cara de louco ainda não precipitado) e se achegue depois, com cuidado e ternura, junto à rede languidamente envergada entre plantas lá no terraço. Largue-se nela como quem se larga na vida, e vá ao fundo nesse mergulho: cerre as abas da rede sobre os olhos e, com um impulso do pé (já não importa em que apoio), goze a fantasia de se sentir embalado pelo mundo.

Raduan Nassar, «Aí pelas três da tarde» (1972),
in Menina a Caminho, 1994

Um copo de sangue, brinde a Raduan Nassar

Com a víbora no músculo viscoso da língua
soltava o pensamento na vermelhidão -
- os dentes mordendo-lhe a boca
como se mordessem a carne macia do coração
pendurado no talho de outra vida.
Desenhava a sua geometria passional
com mãos de dorso largo, tronco
de um vulto em chamas -
cada bolha de fogo envenenada de silêncio,
o alicate para lhe arrancar uma palavra de água:
eu não tive o bastante,
mas tive o suficiente

para me esvair nas tuas unhas em fogo

Monday, November 26, 2007

Cheer Up! It's Monday! ou November Mood ou The Overwhelming Question ou Why Do I Love Covers III

Em maré de Belo


PORTUGAL SACRO-PROFANO
Vila do Conde

O lugar onde o coração se esconde
é onde o vento norte corta luas brancas no azul do mar
e o poeta solitário escolhe igreja pra casar
O lugar onde o coração se esconde
é em dezembro o sol cortado pelo frio
e à noite as luzes a alinhar o rio
O lugar onde o coração se esconde
é onde contra a casa soa o sino
e dia a dia o homem soma o seu destino
O lugar onde o coração se esconde
é sobretudo agosto vento música raparigas em cabelo
feira das sextas-feiras gado pó e povo
é onde se consente que nasça de novo
àquele que foi jovem e foi belo
mas o tempo a pouco e pouco arrefeceu
O lugar onde o coração se esconde
é o novo passado a ida pra o liceu
Mas onde fica e como é que se chama
a terra do crepúsculo de algodão em rama
das muitas procissões dos contra-luz no bar
da surpresa violenta desse sempre renovado mar?
O lugar onde o coração se esconde
e a mulher eterna tem a luz na fronte
fica no norte e é vila do conde


Ruy Belo, Homem de Palavra[s], 1970

Sunday, November 25, 2007

Dominó I, II e III

Efeito dominó 1: a propósito de Les Uns et Les Autres

Geraldine Chaplin & Michel Legrand, «Un Parfum de Fin du Monde»

Efeito dominó 2: a propósito do Bolero de Ravel

Rufus Wainwright, «Oh What a World»

Efeito dominó 3: a propósito de grandes finais com grandes clássicos

Morte a Venezia, dir. Luchino Visconti, 1971, música de Mahler

Saturday, November 24, 2007

Maurice mourut

Assim se entende que a cena final de Les Uns et Les Autres, de Claude Lelouch, seja tão absolutamente inesquecível. Já não bastava o outro Maurice ter criado uma das composições mais breathtaking da história da música, ainda tinha este Maurice que fazer dela uma das danças mais breathless de todos os tempos. Maurice est mort, survit le corps.

Maurice Béjart, 1 Jan. 1927-22 Nov. 2007


Jorge Donn in Les Uns et Les Autres, dir. Claude Lelouch, 1980

L’homme s’est aperçu qu’il possédait plus de vigueur, plus de souplesse, plus de possibilités articulaires et musculaires qu’il n’en avait besoin pour satisfaire aux nécessités de son existence et il a découvert que certains de ces mouvements lui procuraient par leur fréquence, leur succession ou leur amplitude, un plaisir qui allait jusqu’à une sorte d’ivresse, et si intense parfois, qu’un épuisement total de ses forces, une sorte d’extase d’épuisement pouvait seule interrompre son délire, sa dépense motrice exaspérée.

Paul Valéry, «Philosophie de la Danse», 1930

Friday, November 23, 2007

Diz que...

...lá para os lados dos Discos Perdidos esta é a soundtrack do fim-de-semana :).

Thursday, November 22, 2007

22 de Novembro de 1710: Não há regresso após tanta invenção



Alegra-me. Mas não para alegrar-me
foi concebida em racionais delírios
de pautas e compassos. Foi-o, sim,
para que eu saiba que criar não basta
se não se for criado assim do nada.


São contra a morte, ou contra a vida, as vozes
que tão fugatamente desconversam?
São contra a terra ou contra o céu as pausas
quase que imperceptíveis que retornam?
São contra as coisas ou são contra os homens
certas singelas notas que persistem?

Ou a favor? Não sei. Talvez que sejam
uma existência que se vive ouvindo
apenas o fluir da música nascida
de não fluir mais nada que não seja a vida.


A música é só música, eu sei. Não há
outros termos em que falar dela a não ser que
ela mesma seja menos que si mesma. Mas
o caso é que falar de música em tais termos
é como descrever um quadro em cores e formas e volumes, sem
mostrá-lo ou sem sequer havê-lo visto alguma vez.
Vejamo-lo, bem sei, calados, vendo. E se a música
for música, ouçamo-la e mais nada.

Quando, no fim,
aquele tema torna não é para encerrar
num círculo fechado uma odisseia em teclas,
mas para colocar-nos ante a lucidez
de que não há regresso após tanta invenção.
Nem a música, nem nós, somos os mesmos já.


Neste silêncio, que ficou, flutua?
O quê?
Nós?
Como tão pouco restaria?

Jorge de Sena, «Prelúdios e Fugas de J. S. Bach, para órgão», «Concerto 'Brandenburguês' nº. 1 em Fá Menor, de J. S. Bach» e «Bach: Variações Goldberg», Arte de Música

Cheap November

E como não há meses perfeitos, este, que é quase quase perfeito, tem o pior problema de todos os meses: é protagonista de uma das tiradas mais desastrosas de toda a história do cinema.

Would you like to be my November?

Wednesday, November 21, 2007

Looks like it's happened again...


The Magic Numbers
I See You, You See Me

Tuesday, November 20, 2007

Evening

Claire Daines/Hugh Dancy
Evening, 2007, dir. Lajos Koltai

Your first mistake is like your first kiss: you never forget it.

Éloge de la Pluie


Guillaume Apollinaire, Calligrammes, 1918

Il pleut des voix de femmes comme si elles étaient mortes même dans le souvenir.
c’est vous aussi qu’il pleut, merveilleuses rencontres de ma vie. ô gouttelettes!
et ces nuages cabrés se prennent à hennir tout un univers de villes auriculaires
écoute s’il pleut tandis que le regret et le dédain pleurent une ancienne musique
écoute tomber les liens qui te retiennent en haut et en bas

Cem Clouzot



Henri-Georges Clouzot
n. 20 de Novembro de 1907